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Bons discos para aumentar sua cultura musical - Pt. II



14º Andar -  Diversão do Novo Mundo (1985) - A banda baiana 14º Andar surgiu no rastro do sucesso de outra famosa banda local, o Camisa de Vênus. Ainda com o nome de Delirium Tremens e uma orientação mais para o punk rock, o trio era uma espécie de The Jam do rock local. Indicados por Marcelo Nova para a gravadora RGE, tiveram a má sorte de terem como produtor ninguém menos que Mister Sam, ou Santiago Malnatti, um dj argentino responsável pelo sucesso de Gretchen, Nahim e outros artistas "pouco recomendáveis". Inexperientes, se entregaram de corpo e alma à sanha do portenho maluco e o resultado foi um álbum equivocado, cheio de excelentes composições mas muito limpo, com guitarras burocraticamente distorcidas e arranjos nem sempre felizes. Até Silvinha , mulher do eterno "o bom" Eduardo Araújo, e à época contratada da gravadora, foi chamada para fazer um estranho e delicioso backing vocal na faixa "A Dança dos Políticos", que se pretendia (e conseguia ser) "funky". Aliás, Malnatti parecia estar totalmente perdido em uma praia que não era a sua, o rock. Em uma faixa, ele tenta fazer o grupo soar como Paralamas, em outra como Legião Urbana, e por aí ia.

O fracasso do disco não foi, absolutamente, culpa dos meninos. À época com menos de 20 anos, deram tudo que podiam para que "Diversão do Novo Mundo" fosse o grande disco que poderia ter sido. Jerry Marlon, hoje considerado um dos melhores baixistas da Bahia, já dava mostras do excelente músico que já era e viria a ser e junto com Jonas Mello, bateria, faziam uma excelente cozinha para a guitarra e voz incomum de Hélio Rocha, compositor e cantor de mão cheia. O problema do disco realmente foi a produção, que conseguiu anular tudo de bom que poderia haver no álbum. Infelizmente o primeiro power-trio da Bahia não teve oportunidade de provar seu valor em um segundo trabalho, melhor produzido e digno do talento do grupo e acabou logo depois. Ainda hoje todos estão envolvidos com música e bem poderiam retornar às atividades.





STRAWBERRY SWITCHBLADE - Strawberry Switchblade (1988) - Onde encontrar o pop perfeito? E, principalmente, para que? Para fazer o que com ele, depois de encontrá-lo? Antes de mais nada, crianças, o pop perfeito não existe. Se é pop, é imperfeito por natureza. Mas, se alguém quiser conhecer um disco que se aproxima, e muito, da perfeição, que ouça o primeiro disco da dupla inglesa Strawberry Switchblade. Seu maior sucesso lá fora é a canção Since Yesterday, mas a que tocou nas nossas rádios em meados de 87 foi mesmo a "bacharachniana" Who Know What Love Is?. Os climas etéreos que remontam ao Cocteau Twins de forma mais pop, quase fazem a gente esquecer da verdadeira overdose de teclados disco adentro. 


O curioso é que a dupla de garotas, as escocesas Jill Brayson e Rose McDowall tocam, respectivamente guitarra-base e solo. Mas tudo bem, estamos na sublime Inglaterra, que costuma criar pequenas (ou grandes) e maravilhosas armações pop. Se é para armar, vamos armar em grande estilo. Nada de Latino, Rouge ou Broz. A terra da Rainha vai de Spice Girls, Bananarama, Robbie Williams e... Strawberry Switchblade. Podem não ser a oitava maravilha, mas...você iria de Backstreet Boys e Britney Spears? De Jill Brayson nunca mais ouvimos falar mas Rose McDowall continuou, em projetos mais "sérios", embora menos "deliciosos", como uns tais de "Current 93" e "Death In June". Mas, se "Strawberry Switchblade", o disco, não é nenhuma criação genial, ainda assim é muitíssimo bom e agradável, afinal, o pop só é perfeito se, justamente, for descartável. Ih, rimou...




The Electric Six - Fire (2004) - Imagine uma banda cujo vocalista chama-se "pinto do dia dos namorados", ou o guitarrista chama-se "indígena do rock and roll"?  E imagine que esta banda faz uma mistura de hard-rock com disco music e soul e ainda soa em muitos momentos como o Kiss? Agora, pra terminar, imagine que o primeiro álbum desta banda é forte candidata a melhor da década passada? Bem, esta banda existe e tem um dos melhores nomes de bandas já inventados. Renato Russo, que Deus o tenha, já dizia que toda banda que tem "electric" no nome, é boa. Exceto a sua própria, ele até tinha razão. Desde as famosas "ameixas elétricas" (The Electric Prunes) que tudo no rock que leva o nome de Electric é bom, vide o famoso "Electric" do Cult ou o mais famoso ainda "Electric Ladyland" do deus Jimmy Hendrix.

Vindos de Detroit, a ex-capital automobilística da terra de Tio Sam, surgiu a bandaThe Electric Six com seu sensacional álbum de estréia, muito apropriadamente batizado de "Fire". Acontece que os "seis elétricos" não são absolutamente uma novidade no cenário local, já tendo gravado dois discos sem sucesso. Foram sete anos de muito barulho e pouco resultado até que o grupo se reformulou, trocou de nome e mudou a sonoridade. E tome-lhe disco music e hard rock em algumas faixas. Em outras, pra variar, tem hard rock e disco music. A fórmula é 50% de um e 50% de outro. Simples. E que me perdoem os chatos, é ótimo pra dançar. A década de zero estava se revelando uma das melhores décadas para quem gosta de boa música. E continuariam assim.



FIRST LAST AND ALWAYS - Sisters Of Mercy (1986) - Já dizia Tia Alice Cooper, ainda no alvorecer dos anos 80, na canção Clones, mais tarde regravada pelo Smashing Pumpkins e pelo Epoxies, que somos todos clones. E, nos anos 80, havia uma multidão de clones (im)perfeitos de David Bowie e Bryan Ferry. O curioso é que os tais clones faziam questão de se parecer com um e com outro, sendo que os dois, apesar de contemporâneos, nunca tiveram grandes similaridades nos respectivos trabalhos. Não vou citar aqui os francamente ruins ou medíocres, pois certamente atingiria a sensibilidade de algumas pessoas como se um punhal lhes atravessasse o coração. Prefiro falar do melhor deles, o que trouxe realmente algo a mais ao universo Bowieferryniano. É claro que estamos falando do esquisitíssimo Andrew Eldritch e da sua banda, a ainda mais esquisita Sisters Of Mercy. Mais particularmente do excelente primeiro disco, que inclusive, deveria ser mesmo o único, já que, não por acaso, se chamava First, Last And Always.

Autor da piada da década, quando rotulou o estilo de sua banda de "heavy-metal" em uma memorável entrevista para um semanário inglês (e o repórter acreditou!), Eldritch ultrapassou os limites da mera cópia, ou mesmo da influência exacerbada e criou um produto original, que dividiu opiniões quando do seu lançamento. Alguns adoraram, outros odiaram, mas ninguém ficou absolutamente em cima do muro. Confesso que demorei muito a entender o estranho universo do cantor de voz baixa..

Cantando em um tom extremamente grave, muito mais grave, inclusive, do que seu tom de voz ao conversar, Andrew Eldritch tenta emular claramente o Bowie do final dos anos 70 e início dos 80, quando o próprio camaleão imitava o cantor inglês Scott Walker. O visual do artista, por sua vez, entrega a vontade de ser Bryan Ferry. Qualquer dúvida, é só dar uma boa olhada na capa de These Foolish Things, do cantor do Roxy Music. Mas , isto é secundário. A sonoridade, e é o que importa, lembra um pouco o Roxy Music dos anos 70, pós saida de Brian Eno, acrescido de uma curiosa bateria eletrônica batizada como "Dr. Avalanche" e beats dançantes que embalaram muitos dos "darks"oitentistas, aqueles seres que dançavam contra a parede e que a lata de lixo da história tratou de jogar fora.


Mas voltando ao Sisters Of Mercy, o disco contém clássicos como "Marian" e "Black Planet", essenciais em qualquer festa revivalista dos anos 80 e a presença de Wayne Hussey, que logo em seguida, sairia, depois de brigar com a banda inteira, menos o baterista, para formar o também muito bom The Mission.Mas, isto ainda é uma outra história.

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