Eu não sou nenhum consultor sentimental nem ando dando conselhos pela internet sobre relacionamentos. Até porque, penso eu, para dar este tipo de aconselhamento é preciso ter uma vida conjugal ilibada, maravilhosa, perfeita e, como todos os casais do planeta, eu não a tenho. Mas justamente por isto, paradoxalmente, é que eu me arvoro a escrever algumas linhas sobre o tema. Até para desmistificar alguns pontos, que parecem óbvios demais, mas não custa nada sublinhar. Na verdade, o amor vive - e sobrevive - de paradoxos. E guarde esta frase para lembrar dela no final deste texto.
Em primeiríssimo lugar: Relacionamentos de propaganda de margarina não existem. Muito menos relacionamentos de postagens do Instagram. Aliás, desconfie de derramamento de afeto mútuo nas redes sociais. Pode significar justamente o contrário do que quer aparentar. E este, sim, é um dos muitos paradoxos do amor.
Todos somos felizes em alguns momentos de uma relação a dois e somos infelizes também em outros momentos. Não existe felicidade absoluta ou com garantia "full time". Um dia, o parceiro pode acordar mais infeliz do que de costume e dar início a um processo irreversível de rompimento. Ou pode ser você que acorde infeliz. Acontece. Vida a dois é presente. Não vive nem de passado nem de futuro. Portanto, cuide bem do seu presente. Dos dois. Aliás, dos três. Este (ou esta ou "estx", como queriam) que está ao seu lado e você tem que enxergar como um presente imperfeito mas sim, um presente, é um deles. Os outros são o seu presente e o do seu parceiro.
Nenhum casal vive uma eterna lua de mel. Nenhum casal transa todo dia e, se ainda transa diariamente, a qualidade do sexo já não é a mesma dos primeiros dias e, mais cedo ou mais tarde, a conta de tanto fogo mantido artificialmente invariavelmente chega. Por mais que um doce seja gostoso, se exageramos em seu consumo, ele enjoa. Portanto, foque na convivência, foque no carinho, no tratar bem. O sexo virá e será consequência e não causa. O tempo de sexo ser causa - quando é - é no início do relacionamento.
Mas também, nenhum casal vive em um eterno inferno. Os momentos bons podem até ser escassos, mas se ainda existe casamento é porque há bons momentos sim. Porém, se os momentos felizes andam raros, converse com seu parceiro. Foquem nos problemas e resolvam-os. Nenhum casamento é rigorosamente perfeito, mas funciona melhor quando os parceiros estão realmente interessados em viver bem com o outro. Se um dos dois se recusa irremediavelmente a isto, é hora de procurar outra cara-metade. Simples assim.
Relações que "dão certo", geralmente, são relações que se equilibram entre renúncia ao ego e individualidade extrema, duas coisas, sim, aparentemente muito contraditórias. Relações que encaram os dias ruins e os dias bons com serenidade, diálogo, carinho e perseverança têm muito mais chance de seguir em frente. Nenhum casal deve tentar medir seu amor pelo amor do outro ou pelas mágoas acumuladas ao longo dos anos. O melhor a fazer é trocar as mágoas por amor. Ou então trocar de amor.
Entre viver uma vida sem concessões a seu parceiro e se subjugar à vontade de uma outra pessoa, escolha um ponto de equilíbrio entre ambas e seja feliz. Evite os aborrecimentos e sim, repito, ofereça amor em troca das mágoas. Ofereça amor principalmente a si mesmo. A felicidade é quase um estado de debilidade controlada, um tanto fútil e efêmera, e muitas pessoas reagem a esta fragilidade assumindo uma persona incômoda, agressiva, polêmica, esperando o verdadeiro milagre de ser amado sem amar. Milagre que, de vez em quando, até acontece. Sim, relações a dois são paradoxais, eu já disse isto.
Falando em amar sem ser amado, amor não precisa ser necessariamente recíproco, no sentido da quantificação. Na verdade, o amor não precisa nem mesmo ser medido. Se é medido, não é amor. É negócio. E, a propósito, uma relação a dois é uma espécie de negócio entre duas partes. Tanto que, em alguns casos, tem até contrato. Haja contradição.
Talvez um goste mais do outro, mas...e daí? Se seu parceiro é livre, se ele se sente livre, pode ir embora quando quiser. E se não vai, é porque quer ficar com você. Quando ele quiser ir, basta arrumar as malas. Um relacionamento alicerçado na liberdade de ir e vir não vai. É uma grande contradição - mais uma - dos relacionamentos chamados de felizes.
O grande ponto é: Nunca, jamais, em hipótese alguma, se sujeite a uma relação abusiva, principalmente aquelas onde você é, ao mesmo tempo, abusado e abusador, que, infelizmente, são as mais comuns. E para terminar a grande receita para ser feliz em um relacionamento a dois: Relacionamentos não têm receita nem bula nem manual de instruções. Relacionamentos são puro improviso. Vivam um dia após o outro e façam valer a pena. Para os dois.
E se você vem de uma longa lista de relacionamentos fracassados, nem precisa dizer, né? O problema não são os seus parceiros, o problema é você. Baixe suas expectativas, aprenda a conviver com as imperfeições dos seus candidatos a futuros amantes. Senta que lá vem clichê, mas não há uma pessoa sequer no mundo que não possa encontrar o chinelo velho para o seu pé cansado. O problema é que tem quem só queira chinelo novo ou, pelo menos, muito bem conservado. E aí, precisa ter um pé impecável. E se seu pé é mesmo tão impecável assim, ou ainda, se você acha que é, vai ter muito chinelo em bom estado correndo léguas de você. Eu disse que amar a dois é pura contradição. Você que fez que não leu.
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