Quando eu fui proprietário de uma loja de discos, ainda nos anos 90, montei uma equipe preparada para atender qualquer tipo de cliente. Havia o especialista em reggae, o especialista em MPB, em rock, em música clássica e até na música mais popular, costumeiramente chamada de brega. Mas sempre os orientei a aprender uns com os outros para poder atender qualquer ouvinte que nos procurasse. O resultado foi ter proporcionado durante 12 anos um atendimento de excelência que é lembrado até hoje, quase duas décadas depois que a loja encerrou as atividades.
Como atualmente sou prestador de serviço no ramo gráfico, eu também sempre procurei me debruçar sobre aquilo que fazia, estudando e procurando entender como funcionava o trabalho ao qual me dediquei. Novamente criei um círculo fiel de clientes que me tem literalmente salvo o dia durante a pandemia, onde a crise acentuada e a falta de clientes vem fechando muitas empresas.
Bom atendimento é peça fundamental para o sucesso de qualquer estabelecimento comercial. Ainda que tenha ótimos preços, variedade, facilidade de estacionamento e pagamento, uma empresa só se solidifica se oferecer também gentileza, educação e sorrisos para quem se torna seu cliente. Senão, com o tempo, tende a perder lucratividade, isto se um concorrente mais esperto não aparecer, acelerar o processo e tomar a clientela.
Em minha cidade há uma filial de uma grande rede de atacarejo do ramo das utilidades domésticas que tem lojas quase que em todo o Brasil. Atacarejos são aquelas lojas com grandes estruturas que vendem tanto a comerciantes quanto a clientes finais, com preços diferenciados. A loja é grande, bem sortida e os preços, ora são bem atrativos, ora nem tanto. Eu, particularmente, não gosto de comprar lá. Acho o atendimento dos funcionários que trabalham nos corredores pouco receptivo e até mesmo transitando entre o distraído e o relapso. Mas é na ida ao caixa que toda a minha antipatia pela empresa toma forma.
A operadora de caixa sempre faz questão de cometer a indelicadeza de abrir o produto que eu estou adquirindo, manusear grosseiramente para verificar se está quebrado ou funcionando. Claro, eu sei que isto é uma diretriz da empresa que é passada a ela. Mas tudo poderia ser feito de outra forma, acompanhado de um "com licença, eu poderia abrir o produto e testar para o senhor?". faria até com que víssemos aquilo como uma gentileza. Poderia haver também um sorriso, mas tudo parece ser feito para deixar claro ao cliente que ele sempre é suspeito de roubo ou fraude até prova ao contrário. Além disto, ou justamente por isto, as moças do caixa me tratam como uma espécie de inimigo ou figura inconveniente. Se eu ousar perguntar, por exemplo, se é possível dividir o valor da compra no cartão e cometer o pecado de pedir para que ela repita a resposta, eu percebo imediatamente no rosto da funcionária toda a impaciência do mundo.
É mais do que óbvio que tal comportamento, comum a todas as moças que recebem os pagamentos naquele atacarejo, é causado pela falta de treinamento ou, ainda pior, por um treinamento equivocado. Gentileza e confiança são fundamentais no comércio e na prestação de serviços e sim, a gente sabe que existem clientes completamente insuportáveis ou até desonestos, mas lidar com estes clientes de forma gentil é um tremendo exercício para atender ainda melhor os clientes aos quais chamamos de "normais".
Recentemente comprei um produto nesta rede. Estava precisando e encontrei pela metade do preço praticado em outras lojas. Não havia como não comprar. No caixa, a moça tirou o lacre, abriu o compartimento de pilhas, ligou, viu que funcionava e carimbou na nota que a mercadoria estava "testada". O mais inútil deste desgaste desnecessário é que nada disso anula a lei que dá 72 horas ao cliente para trocar um produto defeituoso ou viciado.
Ao chegar em casa, percebi um vício de fabricação e retornei à loja, temeroso até de que o produto não fosse trocado, já que havia sido "testado" anteriormente.
Claro que o produto teria que ser trocado por força de lei mas já passou um filme na minha cabeça onde eu me aborrecia e exigia a devolução do valor pago, ou ainda pior, abria um processo na defesa do consumidor contra a empresa. Afinal, se naquela loja era tão difícil pedir ajuda para encontrar um produto, mais ainda difícil era pagar, imagine como seria o pós-venda, onde a empresa não só não lucraria como teria um eventual prejuízo, recebendo a mercadoria avariada?
Para minha mais completa e absoluta surpresa, o setor de trocas da rede, pelo menos o da filial da minha cidade, funciona de forma completamente diferente do resto da empresa. Foram de uma agilidade tremenda. Reconheceram o defeito evidente, me pediram para pegar outra mercadoria idêntica, pediram licença para abrir e testar e ainda ganhei de brinde o sorriso e a simpatia das duas atendentes. Tudo isto em bem menos tempo que eu levei para comprar.
É difícil entender como uma empresa acerta tanto no pós venda e falha justamente nas partes mais essenciais que são a aquisição e o pagamento. Só posso acreditar que quem treinou os funcionários do SAC não foi a mesma pessoa ou empresa que treinou os trabalhadores dos outros dois setores.
Daí a importância de treinar bem os seus funcionários e adotar como filosofia comercial a ideia de que o cliente é um amigo em potencial e não um visitante indesejado. Por não entender algo tão óbvio - o fato que um estabelecimento comercial não sobrevive sem clientela - é que inúmeras empresas fecham as portas todos os dias.
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