Todas as lojas de discos da cidade sofreram com o crescimento desenfreado da pirataria. Lembro até hoje quando um cliente chegou na Plug com uma cópia pirata de Calango, CD do Skank, adquirido no Paraguai, que a Sony havia acabado de lançar. Aquela versão pirata 1.0 ainda tinha uma capinha arrumada, tipo jewel box tradicional, encarte em offset e rótulo do cd pintado. Ainda que transparecesse um certo descuido no acabamento, passaria facilmente por original, muito diferente das outras versões de CDs piratas que viriam depois.
Havia uma conversa fiada na época de que os CDs piratas estragavam os aparelhos, o que era, no mínimo, uma meia-verdade. CD-Rs eram gravados em 8x e os primeiros players suportavam discos prensados em 4x, que era - e ainda é - a velocidade dos CDs prensados em fábricas . Então, quem tivesse um player mais antigo ainda em funcionamento poderia ter alguma dificuldade em tocar os discos gravados e, sim, a insistência em tocá-los poderia levar a um desgaste prematuro da lente. Mas acontece que a imensa maioria dos players de CD já aceitavam discos gravados em 16x - que sequer já estavam disponíveis no mercado brasileiro - e não havia nenhum sentido na narrativa de que os CDs piratas poderiam causar danos reais a um aparelho.
O CD pirata fechou quase todas as lojas de Feira de Santana. Das 36 existentes no auge do compact disc restaram quatro ou cinco. Ainda que nosso faturamento tivesse caído em um abismo, não foi a pirataria que me motivou a mudar de ramo e transformar a Plug Laser em um estúdio de gravações. Era tudo que ruim que vinha embutido no comércio de CDs: Representantes irresponsáveis que enfiavam discos dos seus artistas apadrinhados no nosso pedido, gravadoras que negativavam a empresa sem que existisse débito e vendiam abaixo do preço de custo aos grandes magazines e alguns clientes - muitos poucos, é verdade, mas o suficiente para pesar na razão da minha desistência - que beiravam o surrealismo em suas demandas absurdas e despertavam os nossos mais baixos instintos homicidas.
Sim, nem tudo eram flores na Plug Laser e havia o cliente mala. Era aquele cliente que ouvia o disco quase inteiro na loja e voltava no dia seguinte com ele - muitas vezes com visíveis sinais de uso - para trocar. Havia também aquele outro tipo de cliente cujo aparelho já havia passado do prazo de validade e levava discos perfeitos que engasgavam em seus aparelhos imperfeitos. Depois chegavam a nos ameaçar de morte para que fossem trocados.
Uma hora eu enchi o saco e chutei o pau da barraca. Fechei a loja da noite pro dia e demiti o último funcionário que havia restado. Fui me aventurar na mixagem dos discos piratas que o maior pirateiro de Feira levava para que eu deixasse no ponto para serem "lançados". É bom que se diga, eu mixava e masterizava discos de artistas como Pablo, Nara Costa, entre outros, que não haviam sequer gravado discos oficiais e sobreviviam justamente da pirataria. Que nem era, de fato, pirataria, neste caso.
A Plug Laser ainda mudaria de ramo mais uma vez se tornando uma copiadora/gráfica. Um certo dia, eu acordei chateado mais uma vez e matei a marca de vez, sem dó, transformando-a na Gráfica Popular. Em 2011 eu me dei conta que meu negócio não era uma gráfica e nem era popular e foi assim que surgiu a Copiadora Modelo.
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