Em 2006 meu casamento havia chegado ao fim, tinha feito um punhado de canções mais maduras e até mesmo mais melancólicas e nada do que eu escrevia parecia muito se encaixar no repertório da LP & Os Compactos. Por outro lado, a banda continuava sem baterista e agora também sem baixista, já que Stephen havia expressado firmemente o desejo de permanecer definitivamente com o seu outro instrumento, a guitarra.
Nesta época, finalmente cedemos ao pedido daquele a quem chamávamos de "Viúva Porcina" - o músico que desde o início da banda queria ter sido o baterista - e o testamos, mas o resultado não foi bom. Encontramos também um guitarrista de heavy metal e Stephen retornou brevemente ao baixo, mas também não deu muito certo.
Como já contei aqui, sempre fomos uma espécie de banda mascote para os fãs de heavy metal. Os headbangers gostavam de nosso som e, por esta razão, fomos convidados para tocar em um evento só com bandas do estilo. Ficamos por último, por escolha nossa, e eu esperava que, ao final, os batedores de cabeça fossem todos embora e tocássemos para as moscas. Muitos, de fato, foram embora, mas boa parte deles puxaram as cadeiras, sentaram em frente ao palco, pegaram suas cervejas e ouviram atentamente o nosso repertório, música por música. E, ao fim, aplaudiram.
Naquela fria madrugada, após o último acorde de "Cinema de Arte", a LP & os Compactos encerrava, ainda que oficiosamente, as suas atividades, após quatro longos anos. Eu estava namorando uma moça evangélica - o que me deu a fama (que alimentei com alegria pelo horror que a notícia causava) de "ter virado crente" - mas o que acabou mesmo com a LP foram as dificuldades quase que insuperáveis. Quando resolvíamos um problema, aparecia outro. A banda ainda continuaria sem mim, com o nome de Nota Falsa. Nome que, aliás, foi ideia minha. Como Sempre.
Mas a Nota Falsa também não durou muito. Zé Mário logo encontrou alguns pupilos e formou a banda Demodée, iniciando a sua grande epopeia de vocalista de bandas covers que dura até hoje. Stephen foi tocar em um grupo meio emo na época e eu resolvi me aposentar da música pela segunda vez. Sidarta retomou sua própria banda e Douglas, bem, Douglas continuou ainda por um tempo refém da própria mãe
No ano seguinte, um produtor local resolveu fazer a "apresentação de despedida que nunca aconteceu" da LP & os Compactos. Ninguém me convidou, ainda que eu tivesse declinado do convite caso me fosse perguntado se desejaria tocar. Na verdade, eu nem cheguei a saber desse show e sequer fui convidado a estar na plateia. Era um fim melancólico demais para uma banda que tinha meu DNA em cada acorde, ainda que fosse de Zé Mário a foto na capa do disco. Mas eu nunca fui mesmo uma figura muito querida no meio musical da cidade - até por minha própria culpa, por não saber puxar o saco de ninguém e, muitas vezes, ser até hostil a politicagens, conchavos e turminhas - e, para algumas pessoas, aquele era o fim perfeito para a banda do caranguejo que ousou cair do balde.
A LP & Os Compactos ainda retornaria em 2011 para outros quatro anos bem sucedidos de atividade mas isto é assunto para uma segunda temporada de textos que eu ainda não estou a fim de escrever e não sei se há quem ainda esteja a fim de ler. Obrigado a quem acompanhou estes 18 capítulos, os 17 primeiros com cerca de 300 views em média cada um, para minha grande surpresa, sendo que alguns chegaram até a 500 visualizações.
Nosso vocalista me disse que não acha assim tão importante esta série porque "não vive de passado" (sic). Mas, noves fora hoje ele tocar em uma banda que vive justamente de passado (e, neste caso, do passado dos outros), como faz toda boa banda cover, o passado é importante para definirmos quem fomos, quem somos e quem queremos ser. Da LP resultou um grande guitarrista que lançou dois discos e forjou seu nome em uma cena local para lá de árida, um frontman de talento gigantesco que se acomodou se desconstruindo à frente de bandas covers irrelevantes e um compositor que fingiu ser músico e que, depois da idade, viu seu sonho de ser reconhecido minimamente acontecer e se contentou com apenas isto.
A LP & Os Compactos começou como uma vontade de Zé Mário de ter uma banda e, de certa forma, terminou pela vontade dele também. Mesmo algumas vezes renegando ou menosprezando seu grupo original - aquele que lhe deu régua e compasso - formar a LP foi uma ideia dele e será sempre sua eterna responsabilidade. É um karma dele e de mais ninguém. Para Stephen, é a banda em que ele tocou com o pai antes de formar seu próprio grupo e ganhar sua identidade como compositor. Para mim, é o conjunto temporão que tive fora de época, quando achava que não ia mais conseguir reconhecimento. Mas, para Zé, a LP é o início, o fim e o meio.
Em 2022 eu completo 7 anos de retorno ao meu ofício original de jornalista, tendo abandonado a música pela terceira e definitiva vez. Stephen segue enfrentando os desafios da paternidade recente e o único que está fazendo exatamente a mesma coisa que fazia em 2006 é Zé: Estar à frente de uma banda, cercado de meninos, brincando de ser eternamente jovem. Zé hoje me lembra muito aquele professor do filme Escola de Rock interpretado por Jack Black. Longa vida a ele, aos seus alunos e ao rock and roll. O bom professor é o que sabe ensinar o que aprendeu. E Zé seguiu à risca o conselho do ET Bilú, sempre buscando conhecimento.
Ano que vem, a LP & Os Compactos completa 20 anos. Minha homenagem e meu registro já está feito e é esta série de 18 textos. A LP nunca foi os Rolling Stones mas eu sempre fui bem menos Keith Richards do que Zé foi Mick Jagger. A estrela da banda sempre foi Zé Mário e nós, os outros quatro, éramos apenas atores coadjuvantes, embora uns mais coadjuvantes que outros. Se eu pudesse deixar uma mensagem final ao meu eterno, talentoso e querido vocalista, parceiro inequívoco desta longa caminhada, - e, veja só, eu posso - eu diria a ele que "tu és responsável por tudo aquilo que cultivas, meu caro Zé Pequeno". Uma pena ele hoje se contentar em ser Dadinho.
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