Pular para o conteúdo principal

Até o fim dos meus dias.

Minha atual esposa, e que, espero, seja a última, me ensinou a não chorar. Quando me encontrou, como naquela canção de Lulu Santos, "sozinho, perdido, andando de bar em bar" - tá bom, andando de bar em bar é um certo exagero - ela enxugou as minhas lágrimas e me disse para não chorar mais. Levei o seu conselho tão a sério que, efetivamente, nunca mais chorei. Ou quase nunca.


Nestes oito anos de convivência com ela, já chorei algumas vezes, sim, mas nunca por causa dela, é verdade. Também, nem sempre foi um chorar de tristeza, raiva ou decepção. O fato é que, hoje em dia, de alguma forma, meu coração cicatrizou, é verdade, mas as cicatrizes, trouxeram com elas a quelóide da dureza de sentimentos. Hoje em dia, não é qualquer coisa que consegue me fazer chorar. E isto é bom e positivo para mim, um chorão nato, ao menos até conhecer a minha mulher.

Um vídeo que assisti recentemente no You Tube derreteu, por alguns momentos, o meu velho coração de pedra. Trata-se da despedida emocionante de um casal de velhinhos, Laura e Howard, ele com 93 anos, ela com 90, casados há 73 anos. Ela está em um leito de hospital, em  estado terminal - viria a falecer algumas horas depois da gravação - e ele, visivelmente transtornado pela iminência da perda, solfeja para ela os versos da canção que marcou as mais de sete décadas de convivência entre os dois, "You'll Never Know".

Ela, apesar de saber que morreria dali a alguns instantes, ainda teve a presença de espírito de pedir ao seu parceiro que "se comportasse" no resto de vida sem ela. Confesso que não apenas chorei, e sim, choveram lágrimas sobre a minha face ao assistir aquilo. Agora mesmo, ao escrever este texto, a vontade de chorar novamente é enorme.

Espero, um dia, chegar à velhice e poder me despedir da minha amada daquela mesma forma intensa que aqueles velhinhos se despediram um do outro. Não tem problema, claro, se for eu o doente em estado terminal, não importa. Ou, ainda, que nenhum dos dois esteja doente e que a nossa despedida ocorra na mais natural das formas, mas quando estivermos bem velhinhos. 

Já quis morrer ao lado de muitas mulheres, hoje eu quero morrer ao lado daquela que vive comigo.  Quero poder dizer a ela que se comporte sem mim, ou, que seja, ouvir as mesmas palavras saindo de sua boca, quando chegar a hora de um dos dois ir embora. Porque, por mais triste que seja a despedida, muito mais triste é não ter vivido um grande amor de verdade, onde um ame o outro da forma segura e tranquila com que nos amamos, eu e minha mulher.  E, eu acredito que encontrei o grande amor da minha vida, aquela com quem quero viver até o fim dos meus dias.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Porque não existem filas preferenciais nos EUA.

Entrei em contato com um amigo norte-americano que morou por muitos anos no Brasil e o questionei sobre a razão de não haver filas preferenciais nas lojas norte-americanas. Ele me respondeu que não havia apenas uma mas várias razões. Uma delas é legal, porque é anticonstitucional. A enxutíssima constituição dos Estados Unidos simplesmente proíbe que determinado grupo social tenha algum direito específico sobre outro. Ou todos têm ou ninguém tem. Então, lhe questionei sobre as ações afirmativas na área de educação. Ele me respondeu que as ações afirmativas seriam constitucionais porque serviriam justamente para nivelar um grupo social em desigualdade aos outros. O que não seria, segindo ele, o caso de gestantes, idosos e deficientes físicos. A segunda razão seria lógica e até mesmo logística: Uma fila preferencial poderia ser mais lenta do que a fila normal e acabar transformando um pretenso benefício em desvantagem. Isto abriria espaço para ações judiciais no país das ações judic

Terra de Anões

Eu hoje estava ouvindo no meu smartphone, enquanto caminhava, aquela música dos Engenheiros do Hawaii chamada "Terra de Gigantes" em que um dos versos afirma que "a juventude era uma banda em uma propaganda de refrigerantes". Criticava-se a alienação dos jovens. E a maioria de nós éramos os jovens, por sinal. Mas o que tínhamos? Tínhamos internet? Tínhamos Google? Tínhamos acesso quase que instantâneo a toda a história da humanidade, a que passara e a que estávamos vivendo? Que culpa tínhamos de sermos alienados se não tínhamos a informação? Pois é, não tínhamos nada. E, ainda assim, éramos a banda na propaganda de refrigerantes. Como também disse o mesmo compositor, éramos o que poderíamos ser. Pelo menos, errados ou certos, éramos a banda. E hoje, com toda a informação em suas mãos, o que os jovens se tornaram? Se tornaram um bando em uma propaganda de refrigerantes. Gente que se deixa iludir por truques "nível fanta" em vez de tentar consumir

NOS TEMPOS DA BRILHANTINA.

      T em filme que envelhece bem, permanecendo um clássico muito tempo após ser lançado, ainda que seja, ao menos a princípio, datado. Um exemplo é o filme Blues Brothers ("Os Irmãos Cara-de-Pau").  Lançado para capitalizar o sucesso do quadro de Jim Belushi e Dan Akroyd no programa Saturday Night Live , a película acabou alcançando dimensões muito maiores do que a originalmente planejada, se tornando um sucesso mundial e provocando um renascimento (ou surgimento) do interesse pelo rhythm and blues e pela soul music entre os jovens e apreciadores de música em geral. O utros são tão oportunistas - ou aparentam ser - que, desde o lançamento, são considerados lixo,  trash-movies . Muito criticados no momento em que ganharam as telas dos cinemas, adquirem respeito e alguma condescendência com o passar dos anos. O exemplo ideal deste tipo de filme seria Saturday Night Fever , o nosso "Embalos de sábado à noite". Revisto hoje em dia, seu simplismo e aparênc