Pular para o conteúdo principal

Dos discos de cabeceira: New Order - "Get Ready"

New Order - "Get Ready" (2001) - Talvez seja mesmo uma velha mania, que sempre tive, de ser eternamente do contra. Por outro lado, o que é esta mania senão a essência do velho espírito punk? Aliás, senão, pra que punk? E sem punk, como haveria o pós-punk? 

A verdade é que sempre achei e sempre acharei o New Order um agrupamento muito superior em todos os sentidos ao Joy Division. O que eu posso fazer? Não dá para deixar de notar a qualidade das melodias simples mas eficientíssimas de Bernard Sumner, que substituíram muito bem as atonalidades febris de Ian Curtis


Isto sem falar do clima hipnótico das canções e dos teclados etéreos de Gillian Gilbert...uau! Apesar de manter em minha modesta coleção de discos os dois exemplares seminais da banda de Ian Curtis (tem horas que nada cai melhor do que a voz soturna do nosso suicida preferido discernindo sobre a dor de viver). O problema é que, a beira dos quarenta anos de idade, estas horas vão ficando cada vez mais esparsas, e a banda-fênix, que renasceu das cinzas do Joy Division é a que realmente me emociona. Fora o primeiro disco, que é um rascunho do que eles fariam depois e, ao mesmo tempo, um Joy Division piorado, tudo é magnífico no som deste grupo. O tipo de música que faz você pensar duas vezes antes de deixar este mundo. Será que no além tem New Order?

Não deve ter. Deus não iria nos dar esta tremenda colher de chá. Claro que, como todo bom fã, eu ´prefiro a "duologia" Low Life/Brotherhood, que gerou alguns dos mais pegajosos hits dos anos 80. São dois discos absolutamente geniais da primeira à última faixa. Mas nenhum, absolutamente nenhum, disco do quarteto é dispensável. E a prova disso é o seu último lançamento, o soberbo "Get Ready". Não, Get ready não é melhor que Brotherhood nem Low Life. Esqueçamos temporariamente estes dois discos. O mais recente lançamento do New Order é uma prova de que o tempo passou muito bem para estes jovens senhores ingleses. 

Sem arriscar nem mesmo o dedão do pé esquerdo além do que a banda já fez, Sumner e companhia conseguem nos apresentar um excelente album. Talvez seja mesmo esta a vontade dos britânicos. Não nos surpreender com novas propostas e nos embebedar com a velha mistura de climas etéreos e guitarrinhas básicas.

"Vicious Streak" que o diga. E "Crystal", e "Turn My Way" e o disco inteiro, enfim. O que o New Order ainda precisa provar? E para quem? Que público, além do seu próprio, ele precisa conquistar? Que a banda fez um disco óbvio, sem riscos? Tudo bem. os fãs agradecem. E pedem muito, muito mais. Estamos prontos.
(Publicado originalmente na revista Vive Le Rock em 2001)

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A CARTA ANÔNIMA

 Quando eu era menino, ainda ginasiano, lá pela sexta série, a professora resolveu fazer uma dinâmica bastante estranha. Naquele tempo ainda não tinha esse nome mas acho que ela quis mesmo fazer uma dinâmica, visto pelas lentes dos dias atuais. Ela pediu que cada aluno escrevesse uma carta anônima, romântica, se declarando para uma outra pessoa.  Eu confesso que não tive a brilhante ideia de escrever uma carta anônima para mim mesmo e assim acabei sem receber nenhuma carta falando sobre os meus maravilhosos dotes físicos e intelectuais. Já um outro garoto, bonitão, recebeu quase todas as cartas das meninas da sala. E sabe-se lá se não recebeu nenhuma carta vinda de algum colega do sexo masculino, escrita dentro de algum armário virtual. Eu, é claro, escrevi a minha carta para uma menina branca que nem papel, de óculos de graus enormes e um aparelho dentário que mais parecia um bridão de cavalos. Ela era muito tímida e recatada, havia nascido no norte europeu mas já morava...

Deus prefere os ateus.

N ão sou ateu. Até já pensei que era, mas não, realmente, eu não sou. Isto não me faz melhor ou pior do que ninguém, mas eu realmente acredito em um Deus Criador. Bem que eu tentei ser ateu, mas a minha fé inexplicável em alguma coisa transcendental nunca me permitiu sê-lo. Também não sou um religioso, eu sou apenas um crente, ainda que tal palavra remeta a um significado que se tornou bastante negativo com o passar do tempo. Q uando falo aqui em ateu não falo daqueles ateus empedernidos, que vivem vociferando contra Deus, confundindo-o de propósito com o sistema religioso que O diz representar. Estes são até mais religiosos que os próprios religiosos, ansiosos de que convencerem os outros, e a si mesmo, de que um Deus não existe. Quando menciono os ateus a quem o Divino prefere, eu me refiro àquele tipo de pessoa que não se importa muito se Deus existe ou não, mas, geralmente, são gentis, solícitos, generosos, éticos e muito mais honestos que muitos religiosos. E u bem que tent...

LEMBRANÇAS DE WILSON EMÍDIO.

E sta é uma história sobre rock e amizade. Não importa muito se você nunca ouviu falar de  Wilson Emídio.  Certamente, se você gosta das duas ou de uma das coisas - rock e fazer amigos - , você vai gostar do que vai ler aqui. E m 1984, eu tinha uma banda de rock chamada Censura Prévia. Ensaiávamos na sala de estar de minha casa, assim como os Talking Heads ensaiavam na sala de estar do David Byrne no início da carreira. Tanto que, ao ver aquelas fotos do disco duplo ao vivo da banda  nova-iorquina,  me remeto imediatamente àqueles tempos. E, por mais incrível que possa parecer, nós tínhamos duas fãs. Eram duas vizinhas que não perdiam um ensaio, sentadas no sofá enquanto se balançavam, fazendo coreografias, rindo muito e tomando refrigerante. Um dia elas resolveram criar  um fã-clube para o nosso conjunto amador. Na verdade, elas mandaram uma carta para a revista Rock Stars,   uma publicação de quinta categoria, mas baratinha e acessível aos quebrados ...