Deus é um grande brincalhão, eu não canso de observar isto, pelo menos em minha vida. Quando eu me separei, e como todo recém-separado, estava triste, deprimido e, ainda por cima, em pé de guerra com a minha ex-mulher. Eis que Ele me envia um mensageiro na forma de um psicólogo argentino. Ora, quem me conhece sabe que não confio muito em psicólogos - ainda que minha atual mulher, outra piada de Deus, seja psicóloga - e, sinto muito mesmo pelo rasgo repentino de xenofobia, muito menos confio cegamente em argentinos. Então, um psicólogo argentino, aparecendo do nada para me dar conselhos matrimoniais, só podia mesmo ser coisa de Deus, este eterno fanfarrão.
Um belo dia, este tal hermano psicólogo, que afirmou morar em Feira há muitos anos e eu desconfio que nunca tenha realmente existido, apareceu em meu estúdio para transpor alguns lps para o formato CD. Do nada, me contou que fora casado por vinte anos com a mãe de seus filhos e que estava digitalizando aqueles lps para dar de presente a ela. Contou que fazia questão de a tratar muito bem e que, arrematou, "ex-mulher é para sempre e deve ser tratada como uma rainha destronada, mas ainda assim uma rainha, para o bem dela, do seu, dos filhos e do seu atual relacionamento". Era exatamente o conselho que eu precisava ouvir naquele momento, ainda que nem tivesse um novo relacionamento àquela altura.
Dali em diante, resolvi parar com as brigas e picuinhas e mudei a forma de tratar aquela que agora era a minha ex-mulher. Hoje, passados dez anos da separação e quase oito anos do meu atual relacionamento, vejo que aquele psicólogo argentino fora muito sábio e preciso naquele conselho que ele sequer sabia - ou sabia muito bem - que estava me dando.
Por estes dias, completaram-se 29 anos da data em que conheci a minha ex-mulher. Sou muito bom em gravar datas e tenho uma memória tão boa que chega a assustar algumas ex-namoradas, certas de que não lembro detalhes de nossas picardias. E, além do mais, o encontro que mudaria as nossas vidas definitivamente, aconteceu a três dias do meu aniversário e a dois do dela. Difícil não lembrar.
De lá para cá, foram 19 anos juntos e dez separados, em uma convivência, que suponho, anda cada vez melhor. Mantemos uma respeitosa distância e um fraternal carinho mútuo. Afinal, temos algo, ou alguém, um filho em comum, e que é metade ela e metade eu. Principalmente por conta dos filhos, há de seguirmos o conselho do psicólogo argentino e nos darmos muito bem com nossas ex-esposas. Porque toda mulher, um dia, mais cedo ou mais tarde, sai de nossas vidas. Não é o caso das ex-mulheres.
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