Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de março, 2016

O culto à bolacha preta.

E u não sou saudosista. Sinto muito. Não troco minha câmera fotográfica de 13 mega-pixels, embutida no meu smartphone , por uma câmera digital comum com a mesma configuração, quanto mais por uma daquelas tranqueiras analógicas nas quais se colocavam rolos de filmes e as fotos só eram visualizadas quando eram reveladas.  Da mesma forma, não trocarei jamais meus arquivos flac e ogg dos meus discos preferidos,  - todos catalogados e salvos em meus dois PCs, o de casa e o do trabalho, em dois HDs externos, e muito bem guardados em nuvem, para a eventualidade de serem perdidos - por um arquivo jurássico de mp3  em 128kps , quanto mais por CDs e LPs. R espeito imensamente quem pensa diferente de mim e prefere acumular pedaços de acrílico e vinil em casa a ter seus arquivos de música à mão, seja no carro, casa ou trabalho. Aliás, de fato, uma escolha não inviabiliza a outra. É perfeitamente possível conjugar as duas possibilidades. O audiófilo Ed Motta já disse uma vez que também ouve

Os cemitérios de Moscou.

O utro dia, folheando um velho e empoeirado passaporte, já pensando em renovar para fazer alguma viagem internacional para comemorar o aniversário que se aproxima, encontrei um carimbo em alfabeto cirílico, datado do longínquo ano de 1989. Confesso que nem me lembrava mais daquela que foi, de fato e de direito, a minha primeira viagem internacional, ainda que não tenha sido feita a turismo e sim, a trabalho. N aquele ano, a antiga União Soviética passava por enormes transformações políticas, sob a mão de Mikhail Gorbatchev . Os olhos do mundo se voltavam, com assombro, para a derrocada, cada vez mais iminente, do regime comunista. Eu trabalhava como assessor de comunicação de um político baiano ligado ao PC do B, hoje em um partido de ideologia completamente oposta, e, tendo ele sido convidado pelo governo russo para conhecer o país, aceitou e ainda levou uma pequena comitiva. Entre eles, estaria um dos seus assessores, que nem seria eu, na verdade. Mas, um pequeno acidente domést

Morena Penha.

E u era realmente fissurado naquela japonesa.  Japonesa brasileira, na verdade. Uma linda nissei, filha mais velha de imigrantes que vieram para o Brasil após o fim da segunda guerra mundial. Magrinha, pinta no canto da boca, cabelo espetado e pose de roqueira. Era metida a radialista e apresentava um programa meio mambembe em uma rádio local.  U sava óculos de grau moderado que a deixava ainda mais charmosa e, enfim, aquela "japa", definitivamente, era quem eu gostaria que fosse a minha Yoko Ono, ainda que ela estivesse mais para May Pang, a belíssima amante nipônica que Lennon arranjou no seu famoso "lost weekend", um breve período de férias conjugais pelo qual o músico passou nos anos 70.   E la era irmã de um dos meus colegas da escola e, pelo menos, uns cinco anos mais velha que eu. Eu ainda brigava com os meus quatorze anos e ela já exalava a jovialidade adulta de quem aguardava ansiosamente adentrar os vinte. A voz...A voz era um quesito à parte. Afi

(A história da música) Gigante.

Q uando eu me separei da primeira esposa, eu estava exatamente como Zeca B aleiro se descreveu na música Telegrama : " T ristinho", " s ozinho" e "mais solitário que um paulistano".  No primeiro aniversário que passei separado, visivelmente depr imido, uma amiga saiu comigo e me levou a um shopping para comprar o presente que ela queria me dar "para me animar": Um DVD da sua banda preferida, os "Los Hermanos". N ão bastasse eu, simplesmente, detestar a banda de Camelo e Amarante -  à exceção de "Anna Julia", uma baita música , da qual gosto até hoje - , ainda que imbuída das melhores intenções, a minha amiga pretendia me "animar" me dando de presente a trilha perfeita para um suicídio. Diga o que quiser dos Los Hermanos , mas, não há nada na obra do grupo, nem mesmo "Anna Julia",  que possa ser adjetivado como  "divertido" ou "animado". F uçando os títulos disponíveis, en

KEITH EMERSON: UM HERÓI IMPROVÁVEL.

O ntem,  voltei do trabalho ouvindo Emerson, Lake & Palmer no som do carro e me senti, repentinamente, triste. Na verdade, nem foi tão repentinamente assim. Passei o dia meio angustiado, reflexivo sobre as cinco décadas quase completas de idade que já se avistavam ao longe no horizonte. Mas foi quando tocaram os primeiros acordes de Take a Peeble , segunda faixa do maravilhoso primeiro disco do trio, ainda de 1970, que eu senti, de fato, a tristeza tomar conta de mim. Ainda não sabia que o líder da banda havia acabado de falecer. A lguns de meus maiores heróis - heróis de um homem sem heróis - se foram do planeta Terra em torno dos 50 anos de idade. Robert Palmer, Dee Dee, Joey e Johnny Ramone, além de Joe Strummer . E a chegada das tais cinco décadas de vida começa a me meter algum medo. Medo, nem tanto de morrer, mas de ir embora sem poder dizer que tenha sido plenamente feliz e realizado. Felicidade é uma experiência um tanto recente em minha vida e eu gostaria de exp

O bilhete de suicídio.

Este talvez seja o meu texto mais incomprendido. Sempre o mantive como o escrevi mas resolvi republicar adicionando este parágrafo. Foi um texto vomitado, com raiva, que escrevi após perder o segundo amigo, um para as cordas penduradas no teto e outro para o veneno de rato. E ambos vieram me anunciar, alguns dias antes, o seu triste intento.  Aconselhei, até mesmo os xinguei, mas nada pude fazer para impedir o ato de desespero, inclusive, por ignorância, podendo até tendo os incentivado. Cansado, extenuado de ser pararraio da frustração  alheia sendo eu mesmo um frustrado e ainda ganhar uma culpa para a vida que não  é minha, escrevi o texto a seguir:  B ilhetes de suicídio deveriam ser vendidos em livrarias como se vendem modelos de contrato de aluguel. Em sua grande maioria são tão previsíveis que poderiam até ser pré-escritos, apenas mudando informações básicas  sobre quem, como, quando e porque estaria se suicidando. M e perdoem o sarcasmo, a frieza, a falta de piedade, como vo

POR HOJE NÃO.

N o dia internacional da mulher, elas jamais deveriam ser parabenizadas. A melhor e mais sincera  homenagem que se poderia fazer a uma mulher, naquele que dizem ser o seu dia, é tratá-la sem nenhuma distinção especial, como faríamos com qualquer pessoa do sexo masculino. A partir de amanhã, sim, as encheríamos de beijos e lhes daríamos flores e bombons, mas por hoje não. Hoje elas seriam tratadas como o ser humano que efetivamente são. A instituição de dias comemorativos para este ou aquele grupo social foi a melhor forma que o sistema encontrou para anulá-los. Finge-se, ao menos por 24 horas, que os aceitamos como "um de nós", sem preconceitos nem discriminação, para, nos outros 364 dias, obtermos uma espécie de licença para continuarmos com a mesma acepção e indiferença com que os tratamos ao longo da história. C om a mulher não é diferente. A mulher está aí, na vida e no mercado de trabalho, lutando pelos mesmos direitos que os homens, conquistando pequenas bat

As minhas ruas.

E u adoraria morar em Bucareste, falar romeno, beijar as belas romenas e andar pelas ruas largas e extensas dos setores populares da periferia daquela cidade com a camisa toda su ja de batom . Não seria nada difícil me sentir em casa por lá. Da mesma forma, não seria nada mal viver no Porto, ou até mesmo em Braga, ou ainda em uma freguesia simpática como Carvalhal e me considerar, para sempre, um cidadão lusitano. Poderia também morar em Glendale, por exemplo, a aprazível cidade californiana entupida de imigrantes. S em sair do Brasil, eu poderia me instalar confortavelmente em São Paulo, São Vicente, São Leopoldo ou qualquer outra cidade de santo ou s anta que aparecesse e logo estaria completamente adaptado àquele local. Quem não gostaria de viver entre as ladeiras de Olinda e respirar a cultura que só aquela cidade pode oferecer? Enfim, sei que me sentiria facilmente em casa em qualquer destes lugares onde já morei, passei algum tempo, visitei ou apenas gostaria de morar.