Eu ainda iria
em muitos outros shows do Camisa de Vênus mas fui me dando conta da crescente
antipatia e soberba do bandleader Marcelo Nova. Com o ego inflado pelo sucesso inegável , Marcelo esqueceu que a fórmula da
enorme aceitação do Camisa na Bahia era
fazer com que o fã se sentisse parte do espetáculo. Nova passou a confundir irreverência com arrogância e a destratar os seus admiradores, seja em cima
do palco seja no contato pessoal. Nos
shows, passou a tratar a plateia como um bando de idiotas a quem dominava. Os
mais descerebrados o idolatravam por isto, porém, as cabeças mais pensantes
logo notaram que não valia mais a pena
pagar para ir a um show para sofrer bullying.
Quando o
truque deixou de funcionar na Bahia, o Camisa de Vênus se preparou para alargar
os horizontes e rumou, primeiro para o Rio de Janeiro, depois para São
Paulo, indo parar no Rio Grande do Sul. Dali em diante a banda perderia
muito do encanto inicial. O segundo disco não me agradou muito, os outros dois
seguintes também, e o Camisa se tornou apenas uma boa lembrança no meu passado.
O Camisa de
Vênus acabou, voltou, acabou de novo, mudou de formação, incluiu “bons
músicos” nas inúmeras formações que se
seguiram – o que era um contrassenso, já
que o charme daqueles primeiros tempos era
justamente a precariedade musical compensada por altas doses de energia
e entusiasmo – e encontrou seu ocaso tocando no Festival de Verão junto a
bandas de axé-music que tanto criticara, com Marcelo tentando polemizar com uma
plateia que não era toda sua e pouco
interessada no som que vinha do palco.
Ainda nos encontraríamos mais três ou quatro vezes pelos palcos da vida, a última com Karl e Gustavo já fazendo parte da versão deles do Camisa de Vênus com Eduardo Scott nos vocais.
Devo dizer que
Gustavo Mullem é o cara. Uma pessoa atenciosa, gentil, bem-humorada, sem
frescuras e, ao mesmo tempo, 100% rocker. Junto a Karl Hummel, formam uma
verdadeira “dupla dinâmica”. E a relação deles dois é de amizade, de gente que
se conhece, se ama e se odeia há muitas décadas. Então, se existem dois
integrantes da banda baiana que parecem completa e literalmente afinados entre
si, são os dois. Nada mais natural que tocassem juntos.
Já Eduardo
Scott é um cara esforçado, simpático, e
muito educado. O conheço dos tempos em que frequentava os ensaios de sua banda
anterior, o Gonorréia, ainda nos anos 80, e dos tempos em que ele trabalhava na
Polygram, nos anos 90, quando eu era
lojista do ramo de discos. Sempre foi
pessoalmente aquilo que é no palco. Mas falta a Scott o carisma inegável de
Marcelo Nova. Quando vi o Camisa ao vivo com o novo vocalista, tive a impressão que Scott agia como um
professor substituto que segue rigorosamente o plano de aula do professor
efetivo. E a culpa não é dele, de Scott. Pelo contrário, aceitar
substituir alguém icônico como Marcelo Nova
foi uma atitude corajosa e digna de todo o respeito.
Conferi este já não novo
Camisa em um show em que tocamos juntos,
no aniversário de um famoso médico baiano. Tocaram os hits respeitando
os arranjos originais, coisa de gente sincera e apaixonada, que não se cansa
nem se envergonha do que já fez. Foi
bom ver
Karl e Gustavo de cabelos
brancos, pagando o tributo devido ao rock and roll, ainda que a antiga energia
não fosse mais a mesma. Havia
legitimidade em toda aquela decadência. (Continua)
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