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Pequeno principe é o c******! Meu nome agora é...

Durante os anos 60 e 70 e resistindo a ainda boa parte dos anos oitenta adentro, um certo livrinho se fazia onipresente entre as jovens cabecinhas pensantes femininas da época. Toda adolescente que se prezasse já havia lido aquele livro fino com um desenho gracioso na capa e citava a sua principal e mais conhecida frase a torto e a direito. Quantas e quantas vezes já ouvi a citação "Tu és responsável por aquilo que cativas", seguida da também inevitável (e natural) citação do autor, (Saint Exupéry). Esta frase era dita em momentos cruciais de um relacionamento juvenil e, no fundo, as adolescentes de ontem ainda são as adolescentes de hoje.  Ipsis Litteris. Só que envelheceram.

Não me entendam mal. As verdadeiras adolescentes de hoje provavelmente nem se dão mais ao trabalho de ler o que quer que seja. E nem as culpo. Se eu nascesse na geração da Internet, não haveria atriz mirim da Globo, por mais bonitinha que fosse, que me fizesse frequentar uma biblioteca ou uma livraria.  Livro é chato, é monótono. Poucos pixels, baixa configuração. E nem tem 3D, touch screen e outros recursos até menos avançados. Livros são feitos pra nós, os "coroas". E "as coroas", estas ainda adoram citar Saint Exupéry (espero estar colocando o acento no lugar certo) como se citasse Sartre ou Kant.

Pensando bem, o autor de "O Pequeno Príncipe", o livro em questão, foi o primeiro filósofo popular. Exupéry está para a filosofia como Odair José está para a MPB. Tem seu valor, é claro. Mas também é piegas e inútil. Afinal, ninguém é mesmo responsável por porra nenhuma que cativa. Só pelo que cultiva.

A proposição da frase , em si só, é uma enorme temeridade. O cativar , mesmo com a intenção de conquistar, não é uma via unilateral. Entre o cativador e o cativado há a anuência, o endosso. No momento em que há o endosso, o cativado perde o direito de requerer eterno dominio sobre o cativador. E mesmo o ato de cativar é um ato que nem sempre é objetivo. Você pode nem perceber que cativou/está cativando alguém.  A ação de cativar pode partir exclusivamente do cativado. E antes que as palavras "cativador" e "cativado" percam aqui o sentido de tanto serem repetidas, afirmo: Saint Exupéry era um farsante. Provavelmente um conquistador barato, empenhado em ganhar o maior número de senhorinhas encantadas com a sua sensibilidade aflorada. E isto seria ruim? Não. Saint Exupéry podia até ser mesmo um farsante. Mas tinha classe.

O que nunca me impediu de evitar lê-lo. Já tive três edições diferentes de "O Pequeno Princípe". Exceto a última, dada por minha ex-mulher na época em que namorávamos,  e que sabiamente devolvi a ela depois de casado, todas acabaram regiamente reutilizadas em presentes a novas namoradas, que adoravam receber uma edição do mimoso livrinho. Nenhuma nunca estranhou o fato do livro vir com uma página a menos, onde ficava a dedicatória da, naquele momento, ex-namorada.

Li por alto. Sei do que trata a história. Sei do pezinho de uma plantinha irritante, que vira uma árvore.  Sei do tal planetinha. Mas não tenho a menor paciência para o Pequeno Príncipe.
Engraçado que , um outro livro, muito mais consistente e com tema muito similar, nunca foi tão popular entre as garotas. Trata-se da história da menina Pollyanna, escrita por Eleanor H. Porter. Pollyanna é uma menina que não faria feio em uma música de Evaldo Braga, de tanto que sofreu na infância. A lição que Pollyanna nos deixa, no livro, é que podemos reverter positivamente tudo que nos acontece de ruim, tentando enxergar nos maus acontecimentos, o seu lado bom.

Filosofia simples, mas eficientíssima. Uma lição de vida simplória, mas que, bem guardada, nos servirá pelo resto da vida. E elas ainda preferem "O Pequeno Príncipe". Talvez por isso, essa geração de mulheres que cresceram influenciadas pelo livro do nobre francês seja tão bitolada, tão complicada.

Ainda bem que a geração atual só lê mesmo seus recados nas redes sociais. Pelo menos minhas netas não serão tão irresponsáveis com os rapazes que cativarem.

Para ouvir lendo este post: "Silvia, 20 Horas, Domingo" de Ronnie Von. Afinal, ele não era o "pequeno príncipe"?

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