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O segundo amor.

Duas mulheres são importantes para definir o que um ser humano será no futuro e como ele irá encarar o mundo pelo resto de sua vida.  Uma delas, claro, é a mãe, primeira e única, referência absoluta de todo que somos e que queremos ser. A mãe é um alicerce perfeito na vida de qualquer ser humano, o nosso primeiro amor. A sua falta deixará qualquer construção humana imperfeita.

Mas quero falar aqui do segundo anjo que nos aparece, assim que entramos em idade escolar: a primeira professora. Por conta de uma sociedade patriarcal, a função de professor primário, acho que nem se usa mais o termo, é, geralmente, dada a uma mulher. E é esta mulher que substituirá as mães em nossa primeira aventura fora do berço, nos preparando para abandonar o seio virtual e enfrentar o mundo lá fora.

E eu tive a sorte e a bênção  de ter uma primeira professora carinhosa, da qual jamais esqueci, mesmo esquecendo como era seu rosto. Seu nome, Consuelo, jamais saiu de minha memória afetiva, ainda que eu não soubesse mais seu paradeiro.

Foi Consuelo que me ensinou a ler e escrever. Foi Consuelo que me fez cobrir livros e livros de caligrafia para que eu pudesse ter a bela letra que eu tenho hoje. Foi ela que me fez tomar gosto pela leitura, que foi paciente com meus devaneios de menino, que jamais riu do sofrimento do qual nem eu mesmo ainda me dera conta que passava.

O mundo, na inocência dos meus cinco anos, era melhor com Consuelo ao meu lado. De certa forma, foi meu segundo amor. Não um amor físico, sequer platônico, mas plenamente espiritual. Perdi Consuelo de vista, cresci e tive outras professoras, algumas, poucas, tão memoráveis quando ela, outras nem tanto assim. Mas nenhuma tão importante quanto a minha professora das primeiras letras. Quem sabe, um dia, a reencontraria para poder lhe dizer o quanto ainda lembrava dela.

Cresci, me tornei jornalista e depois, comerciante. Abri uma loja de discos e uma simpática senhora chamada Consuelo se tornou minha cliente. De cara, ela já conquistou minha simpatia, pois seu nome era o mesmo da minha primeira professora. E ela era tão gentil e delicada que, até imaginei, poderia ser ela a minha professora Consuelo da infância.

Um dia, Consuelo, a minha cliente, estava em minha loja, comprando discos e distribuindo simpatia, e minha mãe apareceu por acaso. Para minha surpresa, elas já se conheciam e após um abraço e exclamações de “quanto tempo”, aquela moça perguntou por “Renatinho”. Minha mãe riu, apontou para mim e disse: -“Olha ele aqui!”. Pois sim, eu era o mesmo Renatinho que Consuelo ensinara a ler e escrever, e ela, ela era aquela cliente que esbanjava simpatia e de quem eu já gostava tanto. Consuelo me conquistara pela segunda vez.

Hoje em dia, ser professor é uma profissão de risco. Agredir educadores, isto sim, deveria ser um crime hediondo.  Eles são a viga mestra de tudo que somos e que poderemos ser. Quem comete uma violência contra seu professor, comete, antes de mais nada, contra seu próprio futuro. Aos meus professores, do jardim de infância à universidade, todo o meu carinho, agradecimento e um profundo e absoluto respeito. A todos os professores que não tive a sorte de serem meus, meu profundo e absoluto respeito. À minha primeira professora, tão querida, desejo o céu em vida e uma vida bem longa para aproveitar.




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