Pular para o conteúdo principal

De cima do baú: Hollywood Vampires - "Hollywood Vampires" (2015)

Em seu livro "An A-Z of hellraisers: A comprehensive compendium of oustrageous insobriety",  o crítico musical Robert Sellers revelou ao mundo a existência, durante os anos 70, de uma confraria de beberrões famosos, fundado pelo músico norte-americano Alice Cooper, chamado de Hollywood Vampires. Do clube fizeram parte, entre outras celebridades,  Bernie taupin, parceiro de Elton John, o próprio Elton John, Ringo Starr, John Lennon, Harry Nilsson, John Belushi e Keith Moon, entre muitos outros. O clã costumava se reunir no Rainbow Bar, na Sunset Boulevard, em Los Angeles, e as "reuniões" viravam a madrugada, contando muitas vezes com  o strip-tease de garotas de programa vestidas de freiras ou de Hitler.

 Em uma entrevista ao site The Quietus, em 2009, Alice Cooper confirmou que tudo que Sellers havia contado em seu livro era a mais pura e cristalina verdade, e lamentava que alguns dos membros daquele clube não sobreviveram, como ele mesmo, se tornando abstêmios e levando uma vida menos desregrada. Ainda hoje há, no Rainbow Bar, uma placa, onde se lê "lar dos Hollywood Vampires".

O super-grupo de rock Hollywood Vampires surgiu como uma descompromissada homenagem aos integrantes da confraria homônima que já se foram, notadamente os que, como Keith Moon, faleceram por conta dos próprios excessos etílicos. Mas não se trata de uma homenagem soturna ou moralista e sim, de uma celebração aos amigos que não estão mais aqui.

O grupo tocou pela primeira vez, na metade de setembro, ao vivo no Roxy Theatre , em Los Angeles, seguindo para as apresentações no Brasil, no festival Rock In Rio. No país com a clássica falta de informação vigente, eles se transformaram na "banda de Johnny Depp", ator e músico bissexto que também participa da formação. Completam o grupo, no disco, Joe Perry, guitarrista do Aerosmith, Matt Sorum e Duffy McKagan, ex-Guns'n'Roses e Tommy Enriksen, do Warlock.

Os Hollywood Vampires também lançaram um disco, auto-intitulado, no dia 11 de setembro deste ano. O álbum, como era de se esperar, é irregular. E é irregular como seria irregular qualquer projeto do tipo. Portanto não deve ser escutado, e principalmente, julgado, com o mesmo rigor com que se ouviria, por exemplo, um disco solo de Cooper, ou um projeto dos ex-Guns. "Hollywood Vampires", o disco, é uma festa, uma celebração. E, como um disco tributo que é, cumpre muito bem a sua função.

O álbum abre com o ator Christopher Lee declamando uma passagem do livro Dracula, de Bram Stoker. Lee, que sempre se aproximou da música pop, participando de discos de artistas como Michael Jackson e Iron Maiden, morreria alguns dias depois de ter feito a gravação. Segue com "Raise the dead", composição da banda em memória dos amigos mortos, e uma furiosa cover de "My Generation", do The Who. "Whole Lotta Love" presta tributo a John Bonham, outra vítima da bebedeira e tem a participação de Brian Johnson, do AC-DC, nos vocais. "I got a line on you" é um original da banda Spirit e deve haver alguma piada interna no fato de uma música deste grupo seguir a uma do Led Zeppelin, por conta das acusações de plágio feitas um ao outro por causa da introdução  de "Stairway To Heaven".

"Five to one/Break On Through" presta reverência aos Doors, enquanto o músico Harry Nilsson é homenageado com outro medley, "One/Jump Into The Fire".  "Come and Get it", de Paul McCartney, e com a participação do próprio, antes eternizada pelo Badfinger, é o calcanhar de Aquiles do disco: a versão é bastante inferior ao original. Mas a correta e vibrante cover de "Jeepster", de Marc Bolan, equilibra o disco novamente e seguem covers bacanas de John Lennon ("Cold Turkey"), Jimmi Hendrix ("Manic depression") e Small Faces ("Ytchycoo Park"). Complementam o álbum um medley com "School's Out", do próprio Alice Cooper (homenagem a David Coverdale?), e "Another Brick in The Wall", do Pink Floyd. A última faixa, "My dead drunk friends", como o próprio nome entrega, é uma outra homenagem, no atacado, a todos os membros mortos que já passaram pelos Hollywood Vampires, no caso a confraria etílica.

"Hollywood Vampires" é um disco que todo fã de rock and roll "clássico" deve ter na prateleira. Se é bom, se é ruim, não importa. Boa parte da história do rock está contada ali. E é só isto que vale. Mas o disco é bom, sim.  Será tocado no meu player de mp3 até o fim dos meus dias.






Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Porque não existem filas preferenciais nos EUA.

Entrei em contato com um amigo norte-americano que morou por muitos anos no Brasil e o questionei sobre a razão de não haver filas preferenciais nas lojas norte-americanas. Ele me respondeu que não havia apenas uma mas várias razões. Uma delas é legal, porque é anticonstitucional. A enxutíssima constituição dos Estados Unidos simplesmente proíbe que determinado grupo social tenha algum direito específico sobre outro. Ou todos têm ou ninguém tem. Então, lhe questionei sobre as ações afirmativas na área de educação. Ele me respondeu que as ações afirmativas seriam constitucionais porque serviriam justamente para nivelar um grupo social em desigualdade aos outros. O que não seria, segindo ele, o caso de gestantes, idosos e deficientes físicos. A segunda razão seria lógica e até mesmo logística: Uma fila preferencial poderia ser mais lenta do que a fila normal e acabar transformando um pretenso benefício em desvantagem. Isto abriria espaço para ações judiciais no país das ações judic

Terra de Anões

Eu hoje estava ouvindo no meu smartphone, enquanto caminhava, aquela música dos Engenheiros do Hawaii chamada "Terra de Gigantes" em que um dos versos afirma que "a juventude era uma banda em uma propaganda de refrigerantes". Criticava-se a alienação dos jovens. E a maioria de nós éramos os jovens, por sinal. Mas o que tínhamos? Tínhamos internet? Tínhamos Google? Tínhamos acesso quase que instantâneo a toda a história da humanidade, a que passara e a que estávamos vivendo? Que culpa tínhamos de sermos alienados se não tínhamos a informação? Pois é, não tínhamos nada. E, ainda assim, éramos a banda na propaganda de refrigerantes. Como também disse o mesmo compositor, éramos o que poderíamos ser. Pelo menos, errados ou certos, éramos a banda. E hoje, com toda a informação em suas mãos, o que os jovens se tornaram? Se tornaram um bando em uma propaganda de refrigerantes. Gente que se deixa iludir por truques "nível fanta" em vez de tentar consumir

NOS TEMPOS DA BRILHANTINA.

      T em filme que envelhece bem, permanecendo um clássico muito tempo após ser lançado, ainda que seja, ao menos a princípio, datado. Um exemplo é o filme Blues Brothers ("Os Irmãos Cara-de-Pau").  Lançado para capitalizar o sucesso do quadro de Jim Belushi e Dan Akroyd no programa Saturday Night Live , a película acabou alcançando dimensões muito maiores do que a originalmente planejada, se tornando um sucesso mundial e provocando um renascimento (ou surgimento) do interesse pelo rhythm and blues e pela soul music entre os jovens e apreciadores de música em geral. O utros são tão oportunistas - ou aparentam ser - que, desde o lançamento, são considerados lixo,  trash-movies . Muito criticados no momento em que ganharam as telas dos cinemas, adquirem respeito e alguma condescendência com o passar dos anos. O exemplo ideal deste tipo de filme seria Saturday Night Fever , o nosso "Embalos de sábado à noite". Revisto hoje em dia, seu simplismo e aparênc