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Dos discos de cabeceira: CCR - "Mardi Gras" (1972)

Críticos de rock existem desde que existe rock. E críticos de rock erram desde que resolveram deixar de ser fãs e se tornarem  'críticos'. Assim, trabalhos medianos ou 'sérios', 'de pesquisa', de bandas famosas ou não, se tornam 'clássicos' da noite para o dia. E vice-versa: trabalhos inovadores, ousados e que apontam para uma outra direção se tornam porcarias ao sabor da tinta lançada pelas atormentadas penas dos críticos.

Exemplos não faltam: o grupo Queen ao lançar o injustiçado 'Hot Space', foi massacrado pela crítica dita 'especializada' que julgou o disco à revelia. Canções pop, funks, música eletrônica, nada salvou o LP da ira dos donos da verdade. O resultado foi que a própria banda passou a exorcizar o trabalho, convencida que o disco era mesmo ruim. Certo que era muito mais um disco de Deacon e Mercury do que de May e Taylor, mas, ainda assim, há muita qualidade ali.

E o que o Creedence Clearwater Revival, a virulenta banda de rock dos anos 60 tem a ver com tudo isso? É que este grupo também tem o seu 'Hot Space'. Trata-se do disco 'Mardi Gras', não por acaso o último LP da banda, de 1972. Seu disco mais elogiado é o chatíssimo 'Willy & The Poor Boys', que apesar de conter a ótima 'Fortunate Son' também é o mais 'careta', recheado de blues e canções acústicas. Após demitir o irmão, John Forgety assume as duas guitarras e a banda se torna um trio. Com isso, o Creedence ficou mais compacto e mais pop, ao mesmo tempo que soando ainda mais rock and roll.

Tudo indicava que o grupo iniciaria os anos 70 com o pé direito. Mas eles não contavam com a crítica...A imprensa musical de todo o mundo arrasou com o disco de uma maneira intensa. Todos eram unânimes em afirmar que não valia a pena comprar um LP tão ruim. E funcionou, pois Mardi Gras é um dos discos menos vendidos da banda e nunca foi reabilitado. O próprio grupo acabou não resistindo e terminou ainda neste mesmo ano.

Na verdade, esta é uma legítima obra prima, um disco muito bem gravado, que chega a causar impressão a forma como se ouve claramente todos os instrumentos. Mas não fica por aí. John Forgety está cantando como nunca e tocando horrores também. E a grata surpresa: Neste disco, os outros integrantes estão cantando e compondo também. Logo, na primeira faixa, uma grata surpresa: Em 'Looking For a Reason', um country lento, na medida em que uma canção do Creedence pode ser 'lenta'. 'Take It Like a Friend' é uma canção psicodélica, atípica, mas muito forte.'Need Someone To Hold' é uma balada mais rápida .O country-rock pega fogo em 'Tearing Up The Country'. 'Someday Never Comes' merece atenção especial pois é uma das mais belas canções de todos os tempos e mesmo a crítica curvou-se ao poder de sua melodia e arranjo, ainda hoje, quase 45 anos depois, bastante atuais.

'What Are You Gonna Do' é rascante e funciona como uma 'overture' para a maravilhosa 'Sail Away', extremamente pop e de letra quase infantil, que lembra 'Boys Don't Cry' do The Cure. O hit do disco é a também country 'Hello Mary Loo', regravação de Gene Pitney. 'Door To Door' é muito parecida com 'Take It Like a Friend' e é o momento fraquinho do LP que se encerra retumbante com a pesadíssima 'Sweet Hitch-Hiker'. São apenas 28 minutos de excelente música , que um dia, é de se esperar, a crítica e o público re-escutem e mudem de opinião.opinião.

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