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Educação Artística - Bons discos para aumentar a sua cultura musical.

Junior Senior - "D-d-d-don't stop the beat" (2003)Quem tem mais de 30 anos certamente se lembra de um clip que começou a veicular em 1982 com imagens de desenho animado embaladas por um som contagiante, mistura de funk e pop. A música era Genius Of Love e a banda, suspeitosíssima de ser uma armação já que os artistas sequer se davam ao trabalho de aparecer na tela, era uma tal de Tom Tom Club. Na era da desinformação pré-internet e pré-tudo mais do início da década de 80, demorou algum tempo até sabermos que se tratava de um projeto paralelo de integrantes do visceral grupo novaiorquino Talking Heads.

Mas, até isso acontecer, o estrago já estava feito e muito roqueiro metido a brabo já havia se rendido ao óbvio, que a música era boa mesmo e estávamos conversados. Mas "Genius Of Love" era, sem dúvida, um ótimo single e apenas isso. O lp que continha a pequena maravilha ficava a eras de distância de sua piece de resistance.

O clip de Move Your Feet do duo dinamarquês Junior Senior, simplérrimo, com uma animação precária, que remete aos primeiros jogos de video-game (desculpem-me apenas a imprecisão sobre qual jogo, nunca fui muito ligado em games) mais a irresistível batida e o refrão grudento, repete o impacto causado pelo Tom Tom Club vinte e tantos anos atrás. Mas com muitas vantagens.

Junior Senior são dois caras, um relativamente bem mais velho do que o outro, daí o nome, que são basicamente roqueiros, mas resolveram dar uma tintura "moderna" a seu rock bubble-gum, após uma debandada geral dos músicos originais de sua banda. Sem saco para contratar novos integrantes, criaram versões "para raves" de suas músicas e assim ganharam o mundo.

O seu disco de estréia , "D-d-d-don't stop the beat", é uma espécie de cd-bombril, de mil e uma utilidades. Para os roqueiros antigos, dos sessentistas aos new-wavers, ele oferece 11 canções bobíssimas, mas irresistíveis, um convite à dança. Para os modernos, que enxergam em Fat Boy Slim a palavra final em fusion de dance e rock, uma oportunidade e tanto de se redimir.

Tudo bem que eles pegaram pesado em canções como "Dynamite", onde imitam descaradamente o B-52's, mas e daí? Desde o excelente "Licensed To Ill", estréia rapper dos Beastie Boys, que ninguém faz um disco de rock tão "liberal", descompromissado e, principalmente, divertido. O disco é uma festa, porquê reproduz exatamente o clima de uma festa. E aí vem uma outra referência: o maravilhoso e lendário "Live At The Whiskey-A-Go-Go", gravado ao vivo no famoso clube, onde Johnny Rivers e uma banda enfezada disparavam recriações "punk" de clássicos dos anos sessenta.

Com a dupla baseada na Inglaterra, quando do lançamento deste disco, a ilha saiu da letargia em que se encontrava desde o final dos anos 80, nem que fosse pelo tempo que dure uma festa. Oh, yeah!

The Animals - "Ark" (1983) -  Em 1983, John Lennon já seguia carreira sub-solo há algum tempo, impossibilitando de vez a tão aguardada volta dos Beatles. Os Stones estavam em turné promovendo aquele que seria seu último grande álbum, um disco de soul rock e, saberíamos depois, sobras de estúdio, chamado Tatoo You. Os Hollies estavam de volta com a regravação de um clássico da Motown, os Kinks galgavam as paradas com o multi-platinado State Of Confusion e o The Who anunciava sua milésima turné de despedida.

Foi neste panorama que Alan Price, tecladista, um dos fundadores dos Animals originais, telefonou para o baixista Chas Chandler e pediu que este intercedesse junto a seu antigo desafeto, o vocalista Eric Burdon, para que voltassem a trabalhar juntos em um novo disco da banda. Os argumentos eram irrefutáveis: todos os veteranos dos anos 60 estavam aproveitando aquela "nova onda"; a inimizade entre Price e Burdon, razão do fim da formação original do grupo,  já caducava em 16 anos, e, enfim, todos ainda estavam vivos. Ainda nos anos 60, Burdon se mudaria para São Francisco , nos EUA, onde montaria os "New Animals", depois rebatizados de Eric Burdon & The Animals por força de uma ação judicial impetrada por Alan Price, que seguia com uma banda também chamada "Animals". 

Surpreendentemente, Burdon gostou do projeto e só impôs uma condição, que Zoot Money, da formação americana dos Animals, participasse do álbum, o que foi tranquilamente aceito pelos outros dois. Reunir os antigos membros não foi uma tarefa exatamente difícil e logo eles entravam em estúdio, sem a menor ideia do que iriam gravar. Alguém sugeriu que regravassem os antigos sucessos com uma roupagem "moderna", o que foi imediatamente descartado. Eles queriam material inédito. Sentaram e compuseram todas as canções que fazem parte de "Ark". O resultado é o melhor álbum de uma banda dos anos 60 nos anos 80.

Desprovidos de toda e qualquer auto-indulgência, os Animals não tiveram medo de ousar. Forjaram um som moderno sem parecer revivalista nem um bando de velhotes tentando se passar por meninos. Estão lá, rocks vigorosos ("Loose Change", "Melt Down"), blues e rhythm'n'blues ("Hard Times", "Trying To Get To You") e até canções com um pé no techno-pop ("The Night", "My Favourite Enemy" e "Being There"), além de um surpreendente reggae, "Love Is For All The Time". Burdon está cantando como nunca no auge de seus envelhecidos 43 anos à época e Alan Price, famoso no auge do sucesso por querer que seus teclados fossem mixados mais alto do que os outros instrumentos, toca de forma discreta e precisa, muitas vezes até fazendo uma inimaginável cama para seus companheiros.

Depois do lançamento do disco, o grupo sairia em uma vitoriosa turnée mundial. Ao final, a morte de Chas Chandler, em 1996,  enterrou o sonho de uma nova reunião, mas deixou o legado dos Animals para a geração dos anos 80. A arca.

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